1 de setembro de 2017

Chico-espertos do Catrino


Lá vai um, lá vão dois,
três Chico-espertos a passar.
Um travou-te, outro tramou-te
e o outro está-te a roubar.

Já basta de Chico-espertos
são uma praga Nacional.
É urgente abrir a caça
ao infestante animal!
Discretos, como a carraça,
assumem muitos formatos,
e ao sair dos buracos
de todos fazem pirraça
por entre ardis e boatos.

Com pressa, a ziguezaguear
o esperto faz-se à estrada
a acelerar, prego a fundo,
não espera, que se enfada,
acha que é dono do mundo!
Mas caem luzes vermelhas,
ouvem-se os pneus a chiar.
“Estou rodeado de aselhas!”
- começa o Chico a gritar.

Lá vai um, lá vão dois,
três Chico-espertos a passar.
Um travou-te, outro tramou-te
e o outro está-te a roubar.

Autoditada na lábia
de uma moral muito dúbia,
o Chico adere ao partido
para cultivar “amizades”.
Depois aguarda o devido
curso, cargo ou facilidades.
Nascido de olho aberto
para a lei do menor esforço
desconhece o que é remorso.

Acha estranho que alguém
não faça o que mais convém
por ter noção da justiça.
- “Esse aí tem é preguiça”!
Porque ele está bem de manha,
da cobra até vende a banha!
Mas por entre os favorzinhos
e os malabares do umbigo,
não se lhe conta um amigo.

Lá vai um, lá vão dois,
Três Chico-espertos a passar.
Um travou-te, outro tramou-te
e o outro está-te a roubar.

Um gestorzinho ambicioso
perito da arte estatística
forjou um parecer danoso
sem se achar um vigarista.
Este esperto é perigoso,
faz dos números joguete
e distorce a realidade.
Mas desde que se abolete,
quem saberá a verdade?

Tiveste azar Chico-esperto,
alguém topou a tua mão.
“Os dados não batem certo!
Este gajo é um aldrabão!”
Podes ficar boquiaberto.
Nem todo o teu ar janota
as luvas ou o palavreado
ocultaram a batota.
Estás aqui, estás enjaulado! 

Lá vai um, lá vão dois,
três Chico-espertos a passar.
Um travou-te, outro tramou-te
e o outro está-te a roubar.

25 de junho de 2017

Lenga longa Summer Fest e a Balada do Fogo posto



Lenga longa Summer Fest
e a Balada do Fogo posto

˗ A vida andava parada, lá onde ninguém a quer,
Qual Judas perdi as botas e abandonou-me a mulher.
Andava bem cabisbaixo sozinho a roçar o pasto
em terras mal-amanhadas, que mais não tinha pró gasto.
Cuidar de ovelhas e cabras, ir à lenha, um trabalhão,
por acidente a queimada escapou-se-me e fez clarão.
Vieram gentes aos gritos com as mangueiras na mão
e inaugurei uma moda, um Festival de Verão!

Era uma vez um país 
com incêndios no Verão 
e estava sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! (2x)

Chamaram os Voluntários pra vir apagar o fogo.
Os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder!

Chamaram a Aviação prá ajudar os Voluntários
mas o  avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder!

Encomendaram Estudos prá ajudar à protecção
e os Estudos falam de prevenção
nos campos agora abandonados
 e o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! (2x)

˗ Vem comigo Aurora Ruiva ao Festival do Verão
que eu quero ver-te rosada no decorrer da estação.
Eu agarro no isqueiro e vou vingar-me afinal.
Vêm sirenes e bombeiros numa orquestra teatral.
Enchemos matos desertos com coros de aflitos
ouvimos estalar a terra por entre chamas e gritos.
Ai gosto tanto de vê-los com a mangueira na mão!
Vem comigo Aurora Ruiva ao Festival do Verão.

Era uma vez um país 
com incêndios no Verão
e estava sempre a dizer: É Verão está tudo a arder!(2x)

Chamaram homens de lei para aplicar os Estudos 
e os homens criam várias Leis
mas as Leis não saem do papel
e os Estudos falam da prevenção
e os campos estão abandonados
 e o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! 

Chamaram poderes locais prá aplicar a nova Lei
mas muita floresta é privada
e não há um cadastro nacional
e as Leis não saem do papel
e os Estudos falam da prevenção
e os campos estão abandonados
 e o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! 

Chamaram Quadros de Apoio para a rearborização
 e os Apoios vieram da Europa
e não foram bem fiscalizados
e falta um cadastro nacional
e as Leis não saem do papel
e os Estudos falam da prevenção
e os campos estão abandonados
 e o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! (2x)

- O cartaz já está fechado para o novo Summer Fest
vira o disco e toca o mesmo, que todo o tema é silvestre.
Há giestais renovados e o vento quente assobia,
helicópteros e aviões dão mais ritmo à cantoria.
E a cada ano que passa vivo mais a adrenalina
pois se antes eu quis vingança agora acho que é sina.
Vem comigo Lua Nova ao Festival do meu Verão.
Ai gosto tanto de ver-te com a mangueira na mão!

Era uma vez um país
com incêndios no Verão
e estava sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! (2x)

Chamaram os Sapadores com ajuda dos Apoios
e os Sapadores fazem prevenção
mas o financiamento é limitado
e os Apoios não são fiscalizados
e falta um cadastro nacional
e as Leis não saem do papel
e os Estudos falam da prevenção
e os campos estão abandonados
 e o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! 

Chamaram os Penalistas pra punir incendiários
e o fogo pode levar à prisão
mas ainda é um bom negócio
e os Sapadores foram limitados
e os Apoios não são fiscalizados
e falta um cadastro nacional
e as Leis não saem do papel
e os Estudos falam da prevenção
e os campos estão abandonados
 e o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! (2x)

˗ Fui preso, saí a tempo e retornei ao trabalho,
angariei mais clientes, bulo por gosto e não falho.
E podem tentar parar-me, que pouco vai resultar,
se não for eu vai ser outro, é o dinheiro a mandar.
Mas vem comigo, amor novo, para mais um festival
De olhos raiados de lume atiças-me ao matagal.
Tu agarras-te à mangueira e eu acendo o clarão.
Vem comigo Íris Chama ao Festival do meu Verão.

Era uma vez um país
com incêndios no Verão
e estava sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! (2x)

Chamaram a Administração prá articular Institutos
e o ICNF faz campanhas
mas a execução é criticada
e o fogo não é mau negócio
e os Sapadores foram limitados
e os Apoios não são fiscalizados
e falta um cadastro nacional
e as Leis não saem do papel
e os Estudos falam da prevenção
e os campos estão abandonados
 e  o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder!
E depois pôs-se a gritarQuando é que isto vai mudar?

Levantou-se o Parlamento prá acudir à voz do povo
e o Parlamento ditou sugestões
diretamente para uma gaveta
e o ICNF é criticado
e o fogo não é mau negócio
e os Sapadores foram limitados
e os Apoios não são fiscalizados
e falta um cadastro nacional
e as Leis não saem do papel
e os Estudos falam da prevenção
e os campos estão abandonados
 e o avião só faz combate
e as matas estão desordenadas
e os Voluntários apagam o fogo
e o fogo regressa no Verão.
E o país sempre a dizer: É Verão está tudo a arder! (2x)

- Voltámos ao mês de agosto, regressou a lenga-lenga,
O cuco não queria couves numa tarde solarenga,
E este país grita: Pára! Mas padece de molenga.
Vão bradar por comissões para repensar soluções
e esquecer-se de ir a campo executar convicções
pois em meados do ciclo volta-se atrás em desnorte
que a lenga-lenga do cuco só terminou com a morte.
Vem comigo Morte amiga às plantações do carvão
São a tradição mais longa dos Festivais de Verão!

Agosto de 2016

Esta junção de textos foi escrita no final de agosto do ano passado, quando mais uma vez a minha Trêmoa esteve em perigo de arder e se safou por um triz... não a publiquei aqui nessa altura na esperança, sempre renovada, de que já não fosse necessário e de que este inverno fosse diferente, com modificações e políticas mais interventivas no terreno. 
Mas todos os anos a lenga-lenga de verão se repete... infelizmente este ano começou em Junho e foi mais trágica em mortes do que costuma ser. Infelizmente o tema dos incêndios e da falta de planeamento e ordenamento florestal continua a amedrontar-me. Infelizmente continuo a sentir-me revoltada com tanta inércia e dificuldade em implementar mudanças. 
Desta vez, pelo menos aparentemente, o acontecimento que despoletou a tragédia em Pedrógão Grande e depois em Góis foi natural... mas há outras causas. São conjunturais e estruturais e estão mais que identificadas sem que se consiga modificá-las há anos. Para quando dar a devida atenção, necessária me prática, ao reordenamento territorial e florestal? Para quando dar a devida atenção, necessariamente de proximidade e de terreno, à prevenção de incêndios? As modificações climáticas não desaparecem quando chega o outono. A desertificação do interior e as mudanças nas atividades primárias não vão parar se fecharmos os olhos e assobiarmos para o lado. 
Este inverno foi particularmente seco, ainda estamos em Junho e o verão anuncia-se muito quente... é pois com o espírito alerta que endureço o coração, apreensivo, e me tento preparar mentalmente para os próximos meses...

Destaques

Feriado

O tempo livre da manhã cedo ping a do beirado alaranjado  de telhas de meia cana ping a  porque molha tolos por entre o café quente do feria...